A entrevista que o Bezerra da Silva NÃO me deu.
Tempos atrás eu peguei na biblioteca um livro do Sérgio
Cabral, (o Sérgio pai por que o Juninho é melhor nem falar nada), o “ABC do
Sérgio Cabral”, um livro muito divertido. Sérgio Cabral era jornalista do O
Pasquim e sabe muito sobre samba e cultura popular, apesar de ironicamente,
ser vascaíno.
Então tinha lá no livro uma sacada de gênio que foi a construção de
uma entrevista com Drummond, que na verdade não aconteceu como se concebe uma entrevista, o poeta era bem
avesso a entrevistas, Cabral tratou de inventar uma através da sua pesquisa na
obra do poeta. Ficou tão bacana que eu digitei palavra por palavra e publiquei aqui. Vou colar a brincadeira, com muito "menas" capacidade e diletância de sobra, com o aparato da internet vou me aventurar a “entrevistar” o
Bezerra da Silva, que Deus o tenha, malandraço que segundo dizem foi tão
malandro que pouco antes de morrer deu uma rasteira no diabo e se converteu a
Cristo.
Ah, e toda palavra
nessa entrevista com o Bezerra foi proferida por ele, sim, ainda
que nas suas canções.
TG – Boa tarde seu Bezerra, ouvi dizer que o senhor não
gosta muito de dar entrevistas.
Bezerra da Silva – Assim como Jó suportou provações. Eu
também vou suportar.
TG – Eu li que quando você era menino vendia cocada na praça
Mauá. Qual vendia mais, a preta ou a branca?
Bezerra da Silva – É, cocada boa. Tem preto que come da branca, tem
branco que come da preta. Tem gosto pra todo freguês, só não vale misturar, vai
numa de cada vez, não misture o paladar.
TG – Nos tempos da juventude, a boemia e coisa e tal, a
turma era de briga? Ouvi dizer que o Senhor travou uma navalhada épica com o Zé
Tonico, e ele levou a pior.
Bezerra
da Silva – Se eu não derrubasse, eu caía. Porque o malandro era forte, ele
dava pernada, dava cabeçada, ele era de morte. Logo a mim que o malandro queria
desmoralizar, até a minha crioula de fé falou que na marra ele ia tomar. A
própria lei é quem diz que a defesa é um direito sagrado.
TG – E essa coisa da malandragem, ainda existe?
Bezerra da Silva – Conheço muito malandro que é malandro de
conversa. Se a mulher não mete os peito, eles passa fome a beça.
TG – Você é um compositor respeitado, um cara muito importante
na história do samba. Hoje você vive dos direitos autorais?
Bezerra
da Silva – O meu salário é o mínimo, porém é o máximo que eu consigo vencer, eu
só sei que recebi meu pagamento, que não deu pra comprar meu alimento, remarcaram
os preços, eu fiquei a pé.
TG – Mas o senhor parece feliz agora, ainda que vivendo com
o mínimo.
Bezerra
da Silva – Eu andava nas trevas e clamei por Jesus, encontrei a verdade, um
caminho de luz. Descobri que a vida era só ilusão, é preciso coragem pra tomar
decisão, o encontro com Cristo a Deus me levará, com certeza na vida nada me
faltará, e a paz prometida por Jesus de Nazaré só será concedida pra quem tiver
fé, hoje estou liberto sem mágoa e rancor reconheço em Cristo o meu salvador, o
mal foi banido e no meu peito é somente amor. Ganhei nova vida, com Jesus na frente eu sou vencedor!
TG – E você tava muito mal antes dessa nova vida?
Bezerra da Silva – Hepático, todo esquelético. Todo
raquítico cheio de cosmético, e paralítico, coro hipotético.
TG – Nossa, eu não sabia disso.
Bezerra da Silva – Um cruel da pesada, chorando.
TG – E qual foi o momento mais pesado que o senhor já viveu?
Bezerra
da Silva – Fui n'um forró lá na cachanga do Abdias, nunca vi tanta alegria e
poeira levantar. Mas de repente quando bate meia-noite, chegou um cara com uma
foice mandando o forró parar, mas se deu mal porque não foi de brincadeira. Apareceu
tanta peixeira! Só via faca voar, voar, voar. Só via faca voar. E a culpada da
encrenca foi Quitéria que deitou n'uma capela com o tal de Zé Gambá. O
burburinho chegou no ouvido do marido, foi aí que o boi traído correu lá pra
confirmar. Pegou a nega de chamego com o Zé, quebrou a cara da mulher e começou
o bafafá. E eu que tava no forró, no sapatinho, fui saindo de mansinho me
toquei no bambuzal. Faca voava que nem disco voador.
TG – Faltava a lei Maria da Penha nesse tempo... Um conselho
malandro pra quem tá na pior, abandonado? Pra encerrar.
Bezerra da Silva – Você está no fundo do poço meu irmão, só
existe Jesus Cristo que vai lhe estender a mão. Se você acreditar na palavra que
Jesus é a porta, luz, caminho e verdade sua vida se transformará em um rio de amor.
TG – Eu te agradeço o nosso papo, seu Bezerra!
Bezerra
da Silva – Conversa fiada matou carambola.